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Fugas, tentativas e o teste do Estado: o pós-8 de janeiro e a reação dos condenados da trama golpista

Por Anderson Braga

As fugas e tentativas de fuga de condenados e investigados pelos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023 não são episódios isolados de indisciplina penal. Elas compõem um fenômeno político-jurídico que revela, ao mesmo tempo, a resistência de uma rede ideológica derrotada institucionalmente e os limites operacionais do Estado brasileiro na gestão de crimes contra a democracia.

Desde o avanço das investigações conduzidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF), parte dos envolvidos passou a adotar uma estratégia recorrente: evadir-se do território nacional ou descumprir medidas cautelares com o objetivo de atrasar ou evitar o cumprimento das decisões judiciais. Em comum, esses movimentos revelam a recusa explícita em reconhecer a legitimidade das instituições que julgaram e condenaram os responsáveis pela tentativa de ruptura democrática.

Do ponto de vista político, as fugas operam como gesto simbólico. Não se trata apenas de escapar da prisão, mas de sustentar, para a própria base ideológica, a narrativa de perseguição política. Ao cruzar fronteiras ou tentar se esconder, alguns condenados reforçam o discurso de que seriam “exilados” ou “refugiados”, buscando apoio em ambientes internacionais mais permeáveis a retóricas antissistema. Essa construção, no entanto, esbarra em um obstáculo central: os crimes imputados — abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado e associação criminosa — são amplamente reconhecidos no direito comparado, o que reduz margens para acolhimento externo.

Sob a ótica institucional, as tentativas de fuga também funcionam como um teste de estresse para o sistema de Justiça. Elas expõem falhas pontuais na fiscalização de medidas alternativas à prisão, como uso de tornozeleiras eletrônicas e recolhimento domiciliar, ao mesmo tempo em que pressionam o STF a endurecer decisões. Não por acaso, em resposta a esses episódios, a Corte tem revisto benefícios, determinado prisões preventivas e reforçado a cooperação com a Polícia Federal e órgãos internacionais.

Há ainda um elemento político-partidário que não pode ser ignorado. Parte das evasões ocorre em um contexto de disputa narrativa dentro do campo conservador, no qual lideranças tentam se descolar da violência explícita de 8 de janeiro, enquanto setores mais radicalizados seguem tratando os condenados como mártires. As fugas, nesse cenário, acabam isolando ainda mais os envolvidos, ao transformá-los de “militantes” em foragidos, o que dificulta qualquer tentativa de reabilitação política ou jurídica.

No plano macro, o impacto dessas evasões é limitado. O Estado brasileiro tem conseguido reagir com rapidez relativa, ampliando pedidos de extradição, bloqueando bens e reafirmando que crimes contra a democracia não serão relativizados. Mais do que fragilizar o sistema, as fugas tendem a reforçar a mensagem institucional de que a responsabilização é irreversível e que a impunidade, marca de rupturas passadas da história política nacional, não encontrará espaço no pós-8 de janeiro.

Em síntese, as fugas e tentativas de fuga dos condenados pela trama golpista não representam força, mas fraqueza. São o último recurso de um projeto político que falhou nas urnas, fracassou nas ruas e agora se dissolve diante da resposta firme das instituições. O verdadeiro teste não está na evasão dos réus, mas na capacidade do Estado de manter, no longo prazo, a coerência entre punição, legalidade e defesa intransigente da democracia.

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