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Tarifaço de Trump sobre produtos brasileiros pode ter reflexos indiretos no bolso do consumidor

Medida atinge carne, café e tilápia; impacto inicial recai sobre exportadores, mas especialistas alertam para possíveis efeitos no mercado interno

Por Anderson Braga

O novo tarifaço imposto pelos Estados Unidos sobre produtos brasileiros — anunciado pelo ex-presidente Donald Trump e com início previsto para a próxima semana — já causa apreensão entre exportadores e analistas de mercado. A medida eleva para até 50% as tarifas de importação sobre alimentos como carne bovina, café e tilápia, três importantes itens da pauta exportadora nacional. Apesar de o impacto direto recair sobre os importadores norte-americanos, os efeitos indiretos podem chegar às gôndolas dos supermercados brasileiros.

Carne: queda pontual, alta no horizonte

No caso da carne bovina, os Estados Unidos são o segundo maior destino das exportações brasileiras, ficando atrás apenas da China. O mercado americano responde por cerca de 12% das compras externas, com foco nas partes dianteiras do boi, utilizadas na produção de hambúrgueres.

Com a sobretaxa, a tendência inicial é de que a demanda dos EUA recue, o que poderia gerar uma leve queda nos preços no Brasil em um primeiro momento. “Aqui nós vamos ver o boi cair e, lá na frente, ver a carne subir mais ainda”, resume Cesar de Castro Alves, do Itaú BBA. A redução no preço do boi gordo já é visível: caiu 7,21% em julho, segundo o Cepea.

Mas essa trégua tende a ser passageira. Especialistas alertam para uma retração no número de abates a partir do segundo semestre, com pecuaristas segurando fêmeas para reprodução e redirecionando menos animais para o abate, acentuando a alta nos preços.

Mesmo com a possibilidade de redirecionar parte da produção para mercados como o Egito, a queda na oferta global — estimada em 2% — pode intensificar ainda mais a pressão sobre os preços internos.

Café: estabilidade no curto prazo, incerteza adiante

O setor cafeeiro, por sua vez, encara a nova tarifa com mais cautela. Os Estados Unidos são os maiores compradores do café brasileiro, respondendo por cerca de 16% das exportações. No entanto, o impacto imediato parece limitado.

“Há estoques ainda não taxados nos EUA, e é possível que exportadores e importadores cheguem a um acordo para evitar rupturas nas vendas”, explica Celírio Inácio, da Abic. Além disso, a colheita do café acontece apenas uma vez por ano, o que retarda qualquer efeito prático no mercado.

Em julho, o preço do café caiu 0,36% no Brasil, influenciado pela perspectiva de uma safra maior do tipo robusta, menos exportado para os EUA. Como a preferência americana recai sobre o arábica, a tendência de queda nos preços internos deve se manter — ao menos no curto prazo.

O grande ponto de interrogação está no médio e longo prazo. Caso o tarifaço se prolongue, os EUA poderiam buscar novos fornecedores, enquanto o Brasil teria que realocar seu café em outros mercados. Isso criaria uma nova dinâmica que poderia tanto pressionar os preços para baixo quanto elevá-los, dependendo da resposta dos produtores e da demanda global.

Tilápia: risco elevado e ameaça à cadeia produtiva

O impacto mais imediato e severo, segundo os especialistas, será sentido pelo setor da piscicultura, especialmente pela produção de tilápia. Com 90% das exportações brasileiras do peixe indo para os EUA, a dependência é quase total.

A sobretaxa deve forçar a redireção da produção para o mercado interno, o que pode derrubar os preços no curto prazo. “O efeito sobre os preços será gradual”, afirma Matheus Liasch, do Cepea/USP. A lentidão na transmissão desse impacto ao consumidor, no entanto, esconde um risco maior: o colapso da cadeia produtiva.

“O mercado interno já está saturado. Absorver o volume destinado aos EUA é economicamente inviável”, alerta Eduardo Lobo, da Abipesca. Caso a situação se prolongue, a tendência é que a produção seja freada, o que, ironicamente, pode encarecer o produto futuramente caso a demanda volte a crescer.

Tarifa com data de validade?

Até o momento, produtos que embarcarem até o dia 6 de agosto estarão isentos da nova tarifa, mesmo que cheguem aos EUA depois desse prazo. No entanto, não há clareza sobre a duração da medida. “Não sabemos se as tarifas vêm para ficar, se vão durar seis meses, um ano ou mais”, pondera Fernando Maximiliano, da consultoria StoneX.

A falta de previsibilidade aumenta a tensão entre produtores e analistas. O tarifaço de Trump, embora direcionado ao mercado externo, pode acabar alimentando incertezas dentro das fronteiras brasileiras — com efeitos que, cedo ou tarde, chegarão à mesa do consumidor.


Resumo dos possíveis efeitos no Brasil:

  • Carne: queda pontual nos preços, seguida de alta por redução nos abates.

  • Café: estabilidade no curto prazo; incerteza para o médio e longo prazo.

  • Tilápia: provável queda imediata nos preços, mas risco elevado de retração da produção no futuro.

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